A TERRA DOS ESPRITADOS: JENIPAPEIRO
Francisco Miguel de Moura - Escritor, membro da Academia Piauiense de Letras
Jenipapeiro, terra de muitas histórias vividas, inventadas, guardadas na memória dos descendentes dos baianos que, não se sabe como nem por qual razão, ali aportaram em 1818 e criaram um povo: o jenipapeirense, pois franciscossantense é uma invenção nova, de após o desmembramento do município de Picos. São histórias dos alheiros e mangalheiros que percorreram meio mundo, histórias de plantadores de alho e cebola no rio Riachão, e de mandioca e feijão nos dois chapadões que margeiam o rio, e onde hoje plantam cajueiros e colhem mel.
Mas, na verdade, a história social e política de Jenipapeiro, escrita, estava faltando. E o escritor João Bosco da Silva a desfia, corajosamente, em 300 páginas, com sua pena inteligente e viva, em estilo elegante e forte, depois de longa e angustiante pesquisa. História que o envolve e a mim também, ando por gente como Chodó (primeiro vereador de Picos, nascido ali), Miguel Guarani (mestre e violeiro), Sinhô do Diogo, Simplício Pereira, Neném Belchior, Zé de Chico, Joaquim Quaresma, Mundico de Boronga, Divindade, Paderé, Quincó, Areolino, Francisquinha (a mulher que alinhavou a linhagem das famílias iniciais: Rodrigues, Silva, Sousa e Chaves). Envolve a vida dos moradores, poetas e apreciadores de poesia e lorotas: desde os Macacos, ao Diogo, ao Curral Novo: Joaquim de Mãe Ana, Simplício Moraes (primeiro Prefeito), Eliseu Pereira, Nobre, o Pereirinha, o tio Licínio (ou seu Licínio) – fundador e guardião da igreja. Enfim, todos os Santos (com S maiúsculo) e todos os “espritados”, em parte simbolizados na vivência dos poetas Wilton Santos e Zé de Crispim – verdadeiros poetas ambulantes.
Jenipapeiro, terra já hoje bastante próspera e civilizada, a quinau nas suas vizinhas mais próximas: Santo Antônio de Lisboa e Monsenhor Hipólito (antigos Rodeador e Riachão). Terra dos padres Franco e Mariano da Silva Neto, terra do maior número de apelidos conhecidos em todo o Piauí, quiçá no Brasil.
Que mais poderia dizer? Estilo limpo, corrido, sem muitos atavios nem a carga de anotações de pé-de-página e explicações extras, muitas vezes supérfluas, como soe acontecer com velhos historiadores, João Bosco da Silva, já poeta (veja-se a letra do hino da cidade) e autor também do romance Pensão Cassilda, do livro de contos Geralho e muitas obras inéditas, algumas premiadas em concursos literários principalmente da Fundação Cultural Mons. Chaves, agora é o real historiador de nossa terra, universalizando-a. Finalmente, ponho em destaque a página antológica escrita sobre seu pai – o velho Loura, encerrando a segunda parte do livro. Rico de informações e de cultura, insere também fases da História do Brasil recente, vivida por nosso povo – e o faz de maneira muito eficiente. Porém a matéria principal é a crônica dos “espritados” - palavra popular entre eles e assim pronunciada, significando pessoas que têm espírito (forte, inteligente, vivo, em ação), que enfrentam todos os perigos, todas as barreiras e terminam saindo vencedoras.
“Terra dos Espritados, eu te amo!” – exclama o Autor.
Deliciei-me, na leitura do livro “Jenipapeiro – a Terra dos Espritados”, Gráfica do Povo, Teresina, 2010. Terra de meus pais, avós, bisavós, tetravôs, terra minha. Fiquei com água na boca, vou ler de novo. E amar muito mais minha terra querida e a terra do escritor João Bosco da Silva.